terça-feira, 15 de setembro de 2009

Estrangulando rios


E já não há mais fluidez nas águas que já foram claras, caudalosas e frescas de tanta vida. Roubaram as curvas dos leitos ancestrais e represaram-nos numa imensa reta de concreto.

A cidade vem estrangulando os dois rios há sete decadas, o encontro de suas águas continua sendo um problema não solucionado e agora, há esse clima desértico em SP e o calor concentrado no solo sendo devolvido à atmosfera, e essas mudanças climáticas, essa chuva, essas inversões, a enchente aqui, ali, acolá.

Mais ou menos o mesmo que acontece com o filho dessa maldita cidade, parcialmente imerso em seu próprio clima desértico interior, inundado pela frustrante sensação generalizada de haver falhado, invadido pela incômoda impressão de que foi enganado e deixado para trás.

É possível que ele mesmo tenha estrangulado durante decadas o rio que lhe corre no peito, displicentemente, acabando com sua fluidez, esgotando seu oxigênio e consumindo a energia gerada antes mesmo de ser direcionada ao nível seguinte.

Por enquanto, ele tateia pelo chão, em silêncio, no escuro úmido do apagão. Está soterrado em seu desabamento e é tanto a indiscriminada vítima soterrada quanto o abençoado resgate, cavando cada vez mais perto de si nos escombros misturados à lama.






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